- Isadora! – Flor puxou o braço da amiga. – Aquela senhora
que esta andando com as pernas abertas, toda encurvada, não parece a sua mãe? Acho
que é sim dona Tereza!
- Meu Deus Flor! – Isadora arregalou os olhos e pôs a mão na
boca.
A senhora usava um conjunto de saia e blusa preta, e andava
como se estivesse mancando. Isadora foi até onde ela estava.
- Mãe, eu não disse pra senhora colocar um sapato mais
baixo? – Perguntou Isadora entre os dentes.
- Sim. – Ela respondeu com tranquilidade. – Mas não
combinava com esta roupa.
- Esta roupa também não ta muito curta pra senhora? Quer
passar frio e ficar doente?
- Ahhh pronto! – Tereza entortou a boca.
- Ta, este sapato é
mais bonito, mas é muito alto. – A senhora não esta andando, parece que ta
sendo arrastada pelo salão!
- Para de exagero Isadora! – O sapato é um pouco alto e desconfortável,
mas eu já to aqui e vou ficar com ele mesmo.
- Não é possível Flor! Minha mãe enlouqueceu. – Isadora
esbravejou, e em seguida olhou para os lados para ter certeza de que ninguém
estava olhando.
Dona Tereza colocou a pequena bolsa debaixo do braço e se
desequilibrou, até quase cair.
- A senhora quer cair e quebrar um osso mãe? Se quebrar isso
não cola mais não!
- Eu já vou sentar coisa chata! – Ela ajeitou a saia. – Não
pode nem querer ficar elegante. – Ela olhou pra cima. – Uma festa dessas e eu
não vou me arrumar!
- Mãe, eu vou pedir pra alguém trazer outro sapato pra
senhora, desse jeito não dá. Não adianta ficar elegante e não conseguir andar!
- Quem sabe da minha vida sou eu Isadora. Mas que
implicância, será que eu não sei o que é melhor pra mim?
- Não! Ou não pegaria o sapato da sua neta! – Isadora riu e
cruzou os braços.
- Qual é o problema disso? Preconceituosa.
- Para com isso mãe! Não ligo ser o sapato da Morgana, o problema é ser um numero a menos, e a
senhora ter 75 anos. Se cair o tombo é feio!
- Qual é o problema da minha idade? Não posso usar um sapato
alto e vermelho que você quer anunciar quantos anos eu tenho!
- Calma Isadora, não é pra tanto! – Flor se intrometeu com
uma risada sem jeito. – Ela só vai ficar sentada mesmo.
- Nada disso. – Tereza riu descontraída. – Eu vim pra esta
festa foi pra dançar. – Mas eu não sou boba, eu trouxe o sapato da dança, ta
aqui na minha bolsa.
- Vê se eu posso com isso Flor! – Ela pôs as mãos na cintura.
- Eu com um salto de 3 centímetros, e a minha mãe com esta perna de pau!
- Chega de drama! Só ta apertando um pouco na frente. E tirei
foto com todo mundo em casa antes de sair e ficou uma beleza, na hora do baile
eu troco o sapato. Se preocupe só com a sua fala.
- Tava todo mundo olhando a senhora andando toda torta.
Tereza gargalhou.
- Problema é de quem ta curioso, eu não to atrapalhando a
vida de ninguém, você que ta querendo se meter no que eu uso.
Flor olhou para Isadora, fez sinal com a boca pra ela se
calar.
- Você não sabe o que eu aguento dela Flor, por isso pede
silencio. Fomos ao médico esta semana, e ela perguntou pra ele se tava liberado
o sexo!
- E o que tem isso? - Disse Flor.
- Como assim? Ela fez isso na minha frente, eu fiquei
vermelha igual este sapato dela.
- Bobagem Flor, querida. Isadora parece que tem mais de 90
anos. Ow menina careta! Por isso não arruma namorado...
- E quem disse que eu quero arrumar namorado?
- E precisa dizer?
- Mãe para com isso de arrumar namorado, por favor? Eu não
sou mais adolescente.
- Então para com essas coisas de não poder transar por que
eu sou velha, ou não posso usar saia ou salto, eu uso o que eu quiser. Meu
corpo minhas regras!
- Vixe, sua mãe ta andando com alguma feminista barra pesada
Isadora? Hahahahaha
- Deve estar, só pode!
- Ela ta mais empoderada que você. – Flor gargalhou.
- Ta bom mãe, a senhora venceu! Fica com o seu sapato.
- Claro que vou ficar, jamais tiraria por que você disse.
- Que mulher ranzinza a senhora esta. – Resmungou Isadora.
- Você é minha copia autentica – Tereza sorriu satisfeita.
O salão encheu depressa, logo a plateia estava cheia.
Isadora ia em direção ao palco onde faria a fala inicial da cerimonia de
premiação do hospital.
Dona Tereza foi beber agua, andando devagar com as pernas abertas.
Isadora viu a mãe e mexeu a cabeça querendo rir. Olhou para o lado e deu um
passo em falso, o seu salto de três centímetros grudou no vão descoberto do
piso, Isadora caiu e o salto quebrou.
- Flor, me ajuda. Isso é castigo! – Ela gargalhou enquanto
levantava no chão. - O que eu faço? Vou entrar sem sapato ou mancando.
Dona Tereza se aproximou.
- Toma aqui, pode usar a perna de pau.
- Não, pelo amor de Deus! Com este salto agulha vou cair em
cima do palco.
- É isso ou descalça.
- Já que não tem jeito neh! – Ela bufou. – Pelo menos é meu
numero. - Isadora colocou o sapato no
pé.
Pouco tempo depois Isadora subiu no palco e fez seu
pronunciamento divinamente, se sentiu ótima.
Assim que terminou, desceu do palco e foi falar com a amiga.
- Flor este sapato me deixou com uma postura muito legal. –
Ela riu. – Mas não conta pra minha mãe. Dona Tereza já é muito convencida.
- Claro que não vou contar, ainda bem que ela tinha outro
sapato, ou você estaria perdida.
- Isso é verdade. Ela tem tudo naquela bolsa dela. – Ambas
riram.
Isadora arregalou os olhos:
- Olha aquilo, você ta vendo o que eu to vendo?
- Acho que sim.
Tereza se aproximou das duas amigas.
- Mãe, este não é o Manoel, o mecânico do bairro? – Isadora
cochichou no ouvido da mãe.
- Não, este é o Maciel, meu namorado.
Flor e Isadora se olharam.
- Desculpa ai dona Tereza! – As duas gargalharam.
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